Confesse. Temos aquele console que guardamos em nossos corações, não é mesmo? Por mais que somos gamers e consideramos o videogame como um artifício de acesso a uma arte, independente da plataforma, no fundo no fundo, temos aquele dispositivo favoritado em nossas mentes.
O CONSOLE FAVORITO
Sempre fui um rapaz de um console só, tanto é que meus pais jamais entendiam que haviam “outros” vídeo-games e, o que eu possuía naquele momento, não era “o” vídeo-game. E sei também que eles jamais me dariam dois video-games quando moleque, ainda mais que eu era péssimo na escola…
Na sequência: tive Atari, Nintendo, Super Nintendo, Mega Drive, Game Boy e PlayStation 1. Sim, sempre um de cada. Sempre vendendo o anterior para adquirir o próximo. Todos esses vídeo-games foram explorados com exaustão (exceto o Game Boy pois, infelizmente, eu tinha pouco acesso aos cartuchos). A história minha para adquirir o Dreamcast foi bem curiosa.
Nos primórdios da Internet, em Belo Horizonte, havia o tal do Jornal Balcão, que era um classificado gratuito em versão online e impressa. Ele era o que o OLX somado ao Mercado Livre é hoje: encontrava-se de tudo e era referência respeitável na região metropolitana. Sempre jogava lá alguns anúncios aleatórios de qualquer coisa: já consegui vender aparelho de CD-ROM estragado, modem queimado e até camisa de banda usada.
Aí eu coloquei lá um anuncio do tipo: “troco playstation 1 por dreamcast” na base do “vai que cola”, né? Acho que isso foi no final de 2000, não me lembro exatamente. Playstation 1 ainda era muito popular no Brasil devido ao WINGUELEVEN e afins. E aí, para minha surpresa, um doido se interessou no meu anúncio prontamente e fiz contato imediato para buscar o console dos sonhos num lugar bem sinistro de Belo Horizonte. Sim, o cara trocou comigo um PlayStation 1 com dois controles e uns jogos piratas por um Dreamcast, com dois controles, lightgun, Sonic Adventure original e 2 VMU. Eu saí de lá sem acreditar.
Talvez essa história tenha incentivado a minha escolha de ser o mais cativante vídeo-game de todos os tempos? Pode ter certeza que não.
SEGA SENDO SEGA
A SEGA era cega no presente mas enxergava muito bem o futuro! Lançar tendência e inovação no mercado de vídeo-games era sinônimo de SEGA. Pra começar no visual dos seus consoles. Já repararam o quanto o Master System e o Mega Drive são bonitos? Tudo bem, o Saturn parece um caixote esquisito mas é bonito também! Agora, o visual do Dreamcast é lindo, um trabalho primoroso de design.
As diversas reciclagens que o Mega Drive sofreu são icônicas. Não vamos citar fracassos mas sim relembrar como que a SEGA sempre foi ousada. O SEGA CD é um dispositivo a frente do tempo e possui umas pérolas que precisam ser exploradas por qualquer jogador. O SEGA 32X é inacreditável e, infelizmente, foi pouco explorado. E o NOMAD, um Mega Drive portátil, como alguém poderia imaginar? O hardware do Sega Saturn é tão incrível que ninguém, até hoje, conseguiu explorar ele ao máximo. Fora os jogos, quanta preciosidade o Saturn possui! Enfim, é de se admirar como os engenheiros da SEGA soltavam inovações por pura paixão ao hardware, parecia ignorar estratégias de gestão e marketing.
A MÍSTICA SOB O NOME DREAMCAST
Como disse anteriormente, só o visual do Dreamcast já é cativante. Controle grande (com boa ergonomia) com uma tela no meio. E essa telinha, que é na verdade o memory card. Só que ele é destacável e vira uma espécie de tamagoshi. Haviam jogos exclusivos para aquilo que poderiam ser adquiridos dentro dos próprios jogos do console! E o negócio poderia virar um chaveiro no qual você leva em qualquer lugar, troca save games com os amigos etc. Rapaz, tem noção da genialidade disso?
Um console compacto, bonito, com acesso à Internet e uma biblioteca de jogos primorosa. Sinceramente, é difícil encontrar um jogo dito “ruim” para o Dreamcast. A seleção de jogos é ótima e há títulos memoráveis em cada categoria e estilo. Não vou citar nome de jogos aqui porque senão o artigo fica muito grande mas, preciso citar alguns que viraram referência no mercado, como Phantasy Star Online, Shenmue, Jet Set Radio e Soul Calibur.
E porque ele “deu errado”. Não, amigo, ele não deu errado. O erro foi ele ser certo demais.
Dreamcast. O trajeto dos sonhos. Agora tudo faz sentido.
SOMETIMES TO CREATE, ONE MUST FIRST DESTROY
Dreamcast é o início e o fim. A busca de um sonho chega ao fim quando vira realidade. E a realidade do mercado bateu na porta da SEGA. Eles entenderam que a paixão pelo hardware deveria acabar por ali, para dar espaço às novas criações. Como disse David, em Prometheus (2012):
“Às vezes, para criar, é preciso primeiro destruir”.
O Dreamcast abriu espaço para a Microsoft, que havia investido no console embutindo o Windows CE, para a criação do XBOX e seu controle (na versão inicial) extremamente similar ao Dreamcast. O XBOX, depois, é isso aí que estamos presenciando.
O PlayStation viu que botões analógicos poderiam virar tendência e tratou de implementá-los no PlayStation 2.
A Nintendo, com o lançamento do WiiU, converteu a “telinha” do Dreamcast para uma telona. E segue com a ideia até hoje, com o Switch.
E eu, que era um gamer de um console só, passei a ter mais de um, não porque minha condição financeira mudou e sim porque é o meu dever manter posse do Dreamcast desde então, pois acredito que ele representa a semente da vida na história dos videogames. Seu sacrifício valeu a pena.
Luiz Tinoco